A mim coube, de sempre saber, que as casas têm respiração, pulsação e temperamento. Como tal, guardam um jeito próprio de minar estilos e índoles.
Acreditem, ia eu a desviver-me toda, desaguada de nenhum mar, quando, tangida a seguir dobrei a esquina…
Uma dessas que o pluriverso esconde entre as nuvens e, vi-me acolhida e recolhida num desses cantos-claridade que só!
Casas gêmeas entre si e o resto do mundo.
Ambrosias em cambuquinhas de louça, tronco velho de se contar, uns azulinos de oceano.
Abriu-se a porta e o compassivo abraço de Ligia. Mergulhei em águas de seus braços, naveguei como há muito não sei fazer, encontrada em remos.
Envolvida pelo olhar generoso e luzido de Marília, segui.
As duas em sendo, muito de sentir, solares, aurorando para mim, imaginem…
Atravessado o portal, passos de cuidados e licenças pelo corredor iniciático, eis o útero quente e fecundo onde me abriguei contente de só se ver!
“Grande Companhia Brasileira de Mystérios e Novidades“!
Entendi, de súbito, a plenitude que o espaço esbanjava, ouvi com meus olhos de espanto aqueles risos e cantos, vi com meus ouvidos aguçados cores e asas, bocas e luzes que, para além do espaço tempo, vibravam voláteis, feitas em paninhos e ousadias.
Tecem as duas artistas um novo espetáculo.
Ao centro de centro nenhum, uma linda criatura, pousada em terra nem tão firme, vestia pedaços de céu e nuvens brancas, enquanto bailando em sua órbita, uma mestra em tecituras de tramar, testava abundâncias.
Tudo dançava e espargia silêncios barulhentos e medidos à infinito.
Lembravam os meus sentidos, agora despertos e estremunhados.
Sentei-me, tomada do hiato da vida, pronto para ser sonho.
Testemunha sábia do meu encantamento, fitava-me Trezinha de Jesus, a gatinha, beleza pura, muito de ser metafísica como o são todos os gatos.
Oxalá, meu pai, que de certeza, levou-me pela mão até aquele cadinho de além tempo, sorria seu jeito todo branquinho. Ligia, muito íntima de suas brancuras no ser, abria alegrias.
Ouvi tambores em meu peito antigo vibrarem.
Colhi ikins aos pés do dendezeiro, pedi bênção às espadas de São Jorge. Uma floresta úmida de vida e presença, sombreava minha emoção.
Cheirei alecrim e erva-mãe, vi pedras se moverem, arruda ventar e sossegar, calmarias…
Acreditem!…
Eu vi.
Um oásis no oco mundo.
“Mystérios e Novidades” um fazer teatro em toda potência. Curador, indignado, poderoso, doidamente belo; muito, muito para além do lugar comum que, nos adormeceu em mediocridades e medos, sei lá faz quantas eras.
Hora de ir. Um raminho de arruda, uma dádiva de Ligia. Guardo-o sob o meu travesseiro para sonhos bons.
Anseio voltar em breve, manter-me encantada pelo toque mágico daquele existir.
“Os seres humanos são uma promessa não uma ameaça” Sumak Kawsay
Ligia e Marília,
Vocês são seres solares, promessa cumprida, beleza, cumplicidade e encantaria.
Em carinho e disponibilidade.
Texto e ilustração de Regina Amorim
Deixe um comentário